Nova convenção da OIT acende alerta para o assédio moral

Especialistas apontam rigidez na fiscalização das infrações trabalhistas mesmo entre empregadores e estagiários

A nova convenção da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que classifica os assédios moral, sexual e qualquer outro tipo de violência como uma violação aos direitos humanos, acendeu um alerta para os 187 Estados-membros da Organização. Ainda que para ter aplicabilidade prática precise ser assinado por pelo menos dois países integrantes, o texto já provoca discussão no Brasil. Segundo especialistas, infrações e constrangimentos nos ambientes profissionais devem se tornar ainda menos toleráveis.

A Convenção foi aprovada em 21 de junho por representantes de governos, empregadores e trabalhadores em Genebra, na Suíça, mas ainda não vigora. A partir da assinatura, os Estados-membros assumem a responsabilidade de promover um ambiente geral de tolerância zero à violência e assédio sexual. Após receber 439 votos favoráveis, sete contrários e 30 abstenções, o secretário-geral das Nações Unidas, António Guterres, foi favorável ao texto e parabenizou os Estados por “construírem um legado de conquistas, guiados por essa antiga visão de justiça social por meio de diálogos sociais e de cooperação internacional.”

De acordo com Maiara Colpani, especialista em Direito Trabalhista do escritório Viseu Advogados, a pauta deve causar preocupação no âmbito global. “Será um alerta tão comum quanto o que vemos com o meio ambiente. Agora, fala-se do canudinho, por exemplo, como um ‘vilão’. Mas o assédio será uma preocupação mundial muito forte no ambiente de trabalho”, defende.

Preocupação com o assédio moral no ambiente de trabalho será cada vez mais forte. Foto: Epitacio Pessoa/Estadão

Como a OIT tem estrutura tripartite – composta por governos, organizações de empregadores e de trabalhadores – a aprovação do texto implica em uma interseção entre as concepções das partes. “A construção das políticas da OIT é feita com muita escuta, diálogos de diversos lados e demandas. É muito interessante ver um organismo que tem essa característica conseguir levantar essa questão do assédio”, avalia a consultora de compliance de gênero Monica Sapucaia.

O texto chamou a atenção pelo ineditismo de discutir as diretrizes internacionais sobre o assédio no trabalho e por incorporar às recomendações trabalhistas funcionários até então fora do radar de combate, como estagiários, aprendizes, trainees, voluntários, terceirizados e até candidatos a vagas de emprego constrangidos em entrevistas.

Atualmente, a lei 11.788/2008 elenca direitos e deveres a serem cumpridos por ambas as partes na relação de aprendizado. “A OIT abarcando os estagiários no acordo traz mais benefícios e até mais segurança às partes, por surgirem novas jurisprudências com relação aos julgamentos de processos que estiverem envolvendo estagiários, empregadores que infringiram a lei ou a carga horária”, explica o advogado trabalhista Bruno Sanches, do escritório Sanches & Moura Advocacia e Consultoria.

Supremacia à CLT. A convenção é capaz de superar o que as leis de trabalho, já consolidadas no País, determinam. Para tanto, é preciso que o presidente da República, Jair Bolsonaro (PSL), solicite ao Congresso uma autorização de ratificação. “A Câmara e o Senado vão analisar juntos e considerar a compatibilidade da convenção com o nosso ordenamento jurídico. Com o Congresso autorizando, o presidente deverá informar à OIT que ele está aderindo à convenção, e 12 meses depois passará a vigorar”, afirma o procurador do Ministério Público do Trabalho (MPT) e professor da Faculdade de Direito da PUC Campinas Silvio Beltramelli Neto.

A partir da ratificação, a norma passa a ter validade jurídica no Brasil. Caso seja aprovada com o quórum do Congresso de emenda constitucional, ela ganha a titularidade de uma norma constitucional.

A notoriedade da convenção da OIT no Brasil, e o que a torna tão importante, é a possibilidade de destacar um tipo de prática comum no âmbito trabalhista da norma geral de responsabilidade civil.

FONTE: Estadão

 

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